quarta-feira, 6 de julho de 2011

”É prematuro afirmar se vamos continuar com o futebol sénior" - afirma Manuel Porta, presidente do Lusitano



Sente-se um homem cansado, desmotivado, para continuar à frente do Lusitano? 
Há muitos anos que pertenço à família lusitanista, embora tenha estado afastado durante alguns anos. Após verificar que a situação do Lusitano se estava a degradar dia-a-dia resolvi candidatar-me, sabendo das muitas dificuldades que o clube atravessava e que continua a atravessar. Não esmoreceu o meu lusitanismo nem a minha vontade de salvar o Lusitano. E digo salvar porque a situação é realmente muito má. Herdei uma pesadíssima herança.

Qual o balanço que faz da época que agora terminou?
É evidente que quando participamos numa competição, e até pela longa e rica história do Lusitano, vamos sempre para ganhar. É um facto que não ficámos satisfeitos com o segundo lugar. Mas, tendo em consideração o trabalho que foi feito, dou por bem empregue o tempo que decorreu esta época. Os resultados foram satisfatórios, tivemos uma equipa técnica e de atletas com muita honestidade. 

No fundo, o segundo lugar no  campeonato distrital acaba por ser uma derrota para si?
Considero que foi uma derrota. Tínhamos ambição ao primeiro lugar mas isso não significa que estávamos à vontade para voltar à III Divisão nacional. As dificuldades são muito grandes. Desportivamente, ambicionamos sempre o máximo. Ficámos apenas a um ponto e essa diferença resultou de um empate num jogo que nos deixou algum azedume. Se não fosse assim, teríamos ficado à frente do Redondense. É futebol e por vezes acontecem acidentes de percurso que não nos permitem obter os resultados que esperaríamos.

Quando ouvimos pela cidade rumores, durante a época, da dificuldade do Lusitano para pagar os compromissos com os atletas, que dificuldades foram essas?
Posso dizer que as dificuldades que surgiram têm várias vertentes. A primeira é a desmotivação: muitos sócios deixaram de comparecer aos jogos do Lusitano face a esta reviravolta muito desagradável de termos deixado o Campo Estrela para passarmos a jogar na Silveirinha. Fizemos o nosso campeonato a quase 4 quilómetros da cidade e há muitos sócios que não têm possibilidade de assistir aos jogos. A saída do Campo Estrela para a Silveirinha foi uma causa próxima dessa desmotivação, sem que os sócios consigam entender a razão desse negócio imobiliário que tantos problemas tem causado e continuará a causar ao Lusitano.

O que é que falhou na época desportiva?
Não posso dizer que em termos desportivos o Lusitano tenha passado por grandes problemas, Houve um ou outro jogo não correu tão bem mas o Lusitano manteve uma grande regularidade. A diferença pontual para  o primeiro resulta apenas de um  jogo. Em termos desportivos,  nada tenho a apontar e lamentamos não ter ficado em primeiro  lugar, isto sem esconder as dificuldades porque passámos. Fui  sempre muito frontal e muito  honesto para com os atletas, fui-lhes sempre dizendo que iríamos  pagar na medida das nossas possibilidades 

Faltaram receitas?
Faltaram-nos realmente receitas com que contávamos e daí  terem surgido, algumas vezes,  problemas com os pagamentos  a atletas e treinadores. Apesar  dessas graves dificuldades, tanto  a equipa técnica como os atletas portaram-se lindamente e  fomos sempre ultrapassando os  problema. Eu, como presidente,  já emprestei ao Lusitano alguns  milhares de euros para ver se  conseguíamos, com a compreensão da autarquia … a Câmara de  Évora não conseguiu cumprir o contrato-programa de desenvolvimento do desporto que assinou com o Lusitano.


Isso ainda complicou os problemas? 
Isso agravou ainda mais as dificuldades. Temos uma formação desportiva de algumas centenas de atletas e tivemos muitas vezes de desviar algumas verbas, não muitas, para esse sector. O facto de estarmos simultaneamente na Silveirinha e no Campo Estrela trouxenos um acréscimo de despesas a nível de manutenção do campo, água, luz, gás, para podermos conseguir que esses atletas da formação tivessem um mínimo de condições.

O Lusitano era das equipas com orçamento mais alto?
Não, não. Tínhamos dos orçamentos mais baixos do Distrital de Évora. Reduzimos muito as despesas, fomos obrigados a isso, uma vez que as receitas não subiram.

O facto de estar a competir no Distrital possibilitou uma redução de gastos?
Evidentemente. Houve uma redução de despesas inerentes a deslocações que possibilitou um orçamento muito mais baixo.

E acha que esta poderá ser uma solução para os problemas do Lusitano, até se resolverem os problemas financeiros?
Essa questão é importante, neste momento. Se houver possibilidade, vamos fazer [uma equipa de] futebol sénior e se o fizermos será para ganhar. Temos a esperança de as coisas melhorarem. Se continuarem como estão, estamos na disposição de não participar no futebol sénior, suspender a actividade até que o clube tenha capacidade financeira para participar condignamente.

Quer explicar?
Se [na próxima época] formos participar no Distrital, não o podemos fazer com a bitola de alcançar o primeiro lugar, teremos de fazer uma equipa com muitas limitações e essas limitações correspondem a uma moeda com duas faces. Se participamos, seremos criticados por participar com uma equipa que anda a perder jogos consecutivamente, e somos criticados pelos sócios por não termos uma equipa à altura dos pergaminhos do Lusitano. Se não participarmos, seremos criticados certamente por termos suspendido a actividade do futebol sénior. O que posso dizer neste momento é que estamos a avaliar a situação. É prematuro afirmar se vamos ou não continuar com o futebol sénior.

Imagine que a direcção do Lusitano opta por não competir com a equipa sénior. E que tem de sair do Campo Estrela, comprometendo toda a formação. O Lusitano vai acabar?
Não penso isso. É um facto que [a eventual saída do Campo Estrela] nos cria muitas dificuldades quanto à formação, mas não temos alternativa. Penso que a formação não está em perigo, vai continuar, isto porque o parceiro do Lusitano neste negócio imobiliário continua a afirmar, e não temos razão para não acreditar, que vai ser construído na Silveirinha um campo de relva sintética – se for possível serão construídos dois – e as instalações melhoradas para que a formação tenha campos disponíveis para treinar e jogar, o que não sucede actualmente. No Campo Estrela apenas temos um relvado muito danificado e um campo pelado.

Portanto, a formação não está em risco?
Penso que não está em risco. Estamos neste momento a analisar essa situação porque nos foi dito há dias, numa reunião com elementos da Évoraurbe, que o Lusitano possivelmente ainda vai ter, no mínimo, mais uma época no Campo Estrela. Isto porque a autarquia é muito demorada na aprovação da alteração de uso dos terrenos e enquanto pudermos ali estar vamos continuar a utilizar aquele espaço. Entretanto será possível avançar com a construção, no mínimo, de um campo sintético na Silveirinha.

O que sucederá antes de o Lusitano deixar em definitivo o Campo Estrela?
Exactamente. Aliás, é esse o compromisso que existe entre as
duas partes. Nós só sairemos do Campo Estrela quando tivermos condições para colocar na Silveirinha toda a formação desportiva do Lusitano.

O projecto inicial da Silveirinha previa esses campos sintéticos, uma sede. É para fazer?
É uma questão que nos levaria a uma longa conversa sobre as causas do adiamento constante na conclusão do complexo.


E que são?
A primeira será a morosidade da autarquia na alteração do uso dos terrenos. Essa é a causa principal, de acordo com as informações que temos tido do nosso parceiro imobiliário. A segunda razão tem a ver com o facto de as direcções que antecederam a minha terem recebido todas as verbas que envolviam aquele negócio sem qualquer investimento … portanto, dinheiro gasto em despesas correntes. Se o futuro do Lusitano tivesse sido acautelado nessa altura, teríamos dinheiro para investir. A verdade é que todas essas verbas foram gastas de uma forma negligente, que posso até apelidar de danosa para o futuro do clube, porque se viveu o dia-a-dia sem pensar no futuro. A terceira tem a ver com a exiguidade e a redução drástica do projecto inicial que não vai permitir ao Lusitano ter instalações como estavam [previstas] nesse projecto 
[inicial] … limitar-nos-emos certamente a ter mais um campo  sintético e a melhorar um pouco as instalações que lá estão.


Ou seja, de fazer o que estava  no papel?
Não temos realmente hipótese  [de o fazer] até porque de acordo  com documentos que tenho na  minha posse, as verbas que lá  serão gastas são da livre vontade de ajudar o clube por parte da  Evoraurbe que se disponibiliza  a gastar 200 mil euros pelo facto  de ter pago a prestações o valor  dos bens que adquiriu ao Lusitano.

Como é possível o Lusitano  sair do Campo Estrela para a  Silveirinha sem as coisas estarem resolvidas a nível da  Câmara de Évora? Acha isto  normal?
De forma nenhuma é normal.  Do que conheço, apenas sei que  tudo tem a ver com a morosidade da autarquia porque, primeiro, levou imenso tempo a aprovar o Plano Director Municipal  e, depois disso, o Plano de Urbanização que tem criado alguns  problemas. E é compreensível  essa dificuldade porque aquela zona [envolvente ao Campo Estrela] é uma zona desportiva por  excelência, desde o Juventude,  ao Lusitano e ao hipódromo ...  toda aquela zona se enquadra  numa zona desportiva.  

Nunca sentiu necessidade  de falar directamente com  a Câmara, ir directamente à  fonte?
Tive sempre essa curiosidade,  tenho tido várias reuniões com  o vice-presidente da Câmara  Municipal, de quem sou amigo,  já tive algumas conversas sobre  este assunto com o presidente da  Câmara e tenho estado ao corrente do que se passa. Por vezes,  aos próprios elementos da autarquia, é difícil exteriorizar o que  se passa, todos nós sabemos que  se trata de um processo nada pacífico. Não tenho dúvidas que, se  pudessem, este projecto já estaria concluído. Agora, todos estamos conscientes de que se trata  de um processo que tem encontrado algumas resistências na  autarquia.

Quais as contas correntes,  em traços gerais?
Quando falei em gestão danosa falo apenas na criação de  danos graves para a vida do clube. Não estou a falar, de forma  nenhuma, em factos de natureza criminal. As [anteriores] direcções do Lusitano receberam  cerca de 1,8 milhões de euros  [pela venda de terrenos]. A esta  verba acresce, naturalmente, a  proveniente da quotiziação e de  alguns patrocínios. Foram quantias avultadas que, se tivessem  sido bem aplicadas, colocariam  o Lusitano numa situação bem  diferente daquela em que se encontra.

in Registo - Sérgio Major | DianaFM